quinta-feira, 15 de maio de 2008

Mata Verde - Cap. 12

Na tristeza da solidão: é só quando eles conseguem me ver.

Mas é um momento doce. Sinto o aroma da adrenalina misturando-se, freqüentemente, ao da urina que escorre pelas pernas do vivente. O terror se espalhando pela alma é como uma preliminar. É o beijo que antecede o coito.

Nesse caso, o bebê Pinheiro foi um tanto frustrante. Aliás, foi duplamente frustrante.

Primeiro, porque em sua inocência de primeiros dias, enxergando apenas manchas e luzes, ele não me distinguiu da própria mãe, certamente. O que é irônico, mas não tão gostoso quanto olhos horrorizados. Em segundo lugar, porque naquele corpo havia tão pouca alma. Foi como beber vinho no copo de cachaça: deixa um gosto de quero-mais.

Ainda assim, foi prazeroso enfiar minhas garras imateriais em sua pele tenra e rosada, estraçalhando células e liberando todo o líquido guardado no corpinho. Abocanhar seu rosto com minha boca porca e imunda, minha língua penetrando nas mínimas narinas e sugando, sugando... Eu tinha fome! Há tanto tempo as pessoas dessa cidade maldita não se descuidavam! Eu tinha tanta fome!

Os movimentos dos bracinhos e perninhas foram ralentando até se congelarem numa carcaça oca e seca, cortiça de carne humana. Quando Rafaela e Marconi entraram no quarto, eu já arrotava a alma de seu filho recém-perecido. Tinha gosto de gozo feminino. Gosto de amêndoas e ferrugem.

Eu amo os pequenos descuidos.

Um comentário:

Augusto Galery disse...

Comentário do autor: Estou tentando manter o passo nessa história, mas não está fácil porque a Bia, minha filha recém-nascida, me cansa um bocado. Por favor, tenham paciência com um pai de primeira viagem...

Obrigado!