
- Pára... - eu sussurei. E, em seguida, mais alto: - Pára!
Prosfrus parou de correr e sentiu, no meu olhar, que devia me por no chão. Foi um enterro rápido, o da minha criança. Eu simplesmente a deixei ir, rio abaixo, numa pequena canoa.
Ali, em pé, havia apenas Viramundo. Nem príncipe, nem herói. Alguém que não fora citado nas profecias e que, por isso mesmo, não precisava respeitá-las. E foi que se eu renascesse em Paraíso. Senti-me, como nunca, ligado àquela terra. E quis, intensamente, capturar uma uruguia.
Minhas pernas, é claro, não se recuperaram tão rápidas. Ainda estavam bambas pelo excesso de adrenalina. Andamos devagar, tentando montar uma estratégia para ir atrás dos grandes pássaros.
- Eu notei porque elas conseguem subir tão depressa... - eu comentei - elas não voam para a frente, ao subir. Vão quase que na vertical...
- É verdade. - respondeu Prosfrus - E elas olham para baixo, ao vigiar o perigo. O que as deixa a mercê de um ataque por cima.
- É possível subir em uma das grandes árvores da floresta?
- É. Até fácil. Mas só poderíamos nos esconder na copa. Se ficássemos no tronco elas nos veriam. E seria loucura tentar pular sobre elas daquela altura...
- A não ser que o tempo estivesse mais lento. Será que a própria queda seria mais devagar?
- Eu estive refletindo. Você parece achar que torna o tempo dos outros mais lento, mas não é isso que realmente acontece.
- Não?
- Não. Na verdade, você acelera o seu tempo. Se você diminuísse o tempo do resto do mundo, as conseqüências seriam desastrosas... Você percebeu que já cresceu uns bons dedos desde que chegou aqui? É o seu tempo se acelerando...
Chegamos a uma das árvores no fim da floresta. As uruguias já haviam voltado ao seu banquete, e eu me esforcei para olhá-las se deliciarem com a carne dos combatentes mortos.
- Elas parecem preferir os plurinogorfos... - comentei, e encarei Prosfrus.
Enfim, contei a ele meu plano. Foi difícil convencê-lo. Mas eu deixei claro que ele era responsável apenas por minha educação, e não por minha vida. É claro que a excitação o envolvia e isso facilitava as coisas. Por fim, ele cedeu.
Começamos a coçar o tronco de uma das árvores, de uma forma que Prosfrus me mostrava, e ela se curvou até a copa ficar a centímetros do chão. Prosfrus continuou coçando a árvore e eu subi em um de seus galhos, não sem antes vestir uma das armaduras térmicas. Prosfrus foi ralentando as cócegas até que a árvore se pôs de novo em pé (ele me explicou que se parássemos de repente, a árvore levantaria de uma vez - era como eles faziam para usá-las como catapulta). A altura era estonteante e achei que talvez eu devesse ter aceitado a corda que Prosfrus queria me dar. Não para amarrar a uruguia, como ele sugeriu, mas para me amarrar aos galhos.
Eu preferi tentar, a todo custo, não machucar a uruguia. Havia assistido um documentário sobre o encantador de cavalos e achava que o melhor era tentar me tornar amigo dela. Até porque em Paraíso os animais pareciam mais inteligentes que na Terra.
Olhei para baixo e vi o plurinogorfo se deitar no solo, numa posição estranha. Usando sua capacidade de mutação, ele pareceu amolecer e ficou semelhante a um dos plurinogorfos que estavam caídos pelo campo.
Agora, era esperar.
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